ENCONTROS DE ARTE EDUCAÇÃO - FEVEREIRO

ENCONTROS DE ARTE EDUCAÇÃO

"NARRATIVAS LÚDICAS DA INFÂNCIA - A música e o ritmo, O corpo e a dança, A escuta e o brincar"

EM BREVE!!!

EDUCADORES, PAIS, ARTISTAS, ESTUDANTES E TODOS OS INTERESSADOS EM ARTE, EDUCAÇÃO E LUDICIDADE ESTÃO CONVIDADOS!


Abordando a importância do reconhecimento do brincar como linguagem própria e fundamental da criança e meio por excelência para a construção de conhecimentos sobre si, sobre a relação com o outro e as coisas do mundo. Serão apresentadas aos participantes as contribuições da brincadeira para o desenvolvimento integral, bem como questões presentes na sociedade contemporânea que impedem a concretização de uma infância plena e permeada pela ludicidade.

Para mais informações acesse: www.ateliegiramundo.com ou envie uma mensagem para contato@ateliegiramundo.com

quarta-feira, 17 de julho de 2013

Corpo:: Som e Movimento - redescobrindo brinquedos cantados na africanidade brasileira

Imagem: Heitor dos Prazeres



Todos os povos têm suas brincadeiras pertinentes às necessidades expressivas de cada cultura. Como sonhar acordado, brincar é expor-se de dentro para fora. Segundo a Musicoterapia o som tem propriedades físicas que incidem sobre o corpo humano de forma objetiva e subjetiva, movendo o sujeito afetivamente, interferindo no seu desenvolvimento bio-psicosocial. Vamos fazer uma breve leitura de alguns brinquedos do folclore brasileiro que perpassam as instâncias da arte de brincar , cantar, dançar e imaginar.

Os brinquedos cantados surgem na espontaneidade da cultura popular. Geralmente são cantigas anônimas acompanhadas de movimentos expressivos, saltitantes e ou dramatizados. Nestes brinquedos em geral, as crianças imitam o mundo do adulto vivenciando emoções, sensações e conflitos como veículos de elaboração e amadurecimento.

Dos três povos que inicialmente formaram a cultura brasileira, o português trouxe maior influência para os brinquedos cantados. 

Todos os povos têm suas brincadeiras pertinentes às necessidades expressivas de cada cultura. Como sonhar acordado, brincar é expor-se de dentro para fora. Segundo a Musicoterapia o som tem propriedades físicas que incidem sobre o corpo humano de forma objetiva e subjetiva, movendo o sujeito afetivamente, interferindo no seu desenvolvimento bio-psicosocial. Vamos fazer uma breve leitura de alguns brinquedos do folclore brasileiro que perpassam as instâncias da arte de brincar , cantar, dançar e imaginar.  Os brinquedos cantados surgem na espontaneidade da cultura popular. Geralmente são cantigas anônimas acompanhadas de movimentos expressivos, saltitantes e ou dramatizados.
Nestes brinquedos em geral, as crianças imitam o mundo do adulto vivenciando emoções, sensações e conflitos como veículos de elaboração e amadurecimento.  Dos três povos que inicialmente formaram a cultura brasileira, o português trouxe maior influência para os brinquedos cantados. A oralidade que caracteriza o processo de transmissão das brincadeiras e brinquedos cantados de certa forma transformou as cantigas e os modos de brincar, ocorrendo a mistura dos costumes  africanos com os lusitanos, além das variações regionais de uma mesma brincadeira  (CASCUDO,1988). No entanto, os ritmos e danças africanas deram um tempero mais  brejeiro ao legado lúdico brasileiro.
Até o século XIX as brincadeiras das crianças eram muito limitadas pela rigidez  patriarcal imposta ao comportamento infantil, e porque os infantes eram vistos como  miniadultos. Freyre (2005) conta que muitas crianças brancas eram criadas pelas  escravas africanas juntamente com seus filhos negros, os quais eram mais habilidosos  com a natureza, mais dados a traquinagens e a criatividade devido a sua condição servil.
Outro aspecto característico das brincadeiras infantis no tempo colonial  brasileiro, é que as crianças ao acompanharem seus pais no labor cotidiano da casa  grande ou do  jeito, repetiam em suas brincadeiras estes afazeres e também o contexto de  violência vivido na época. (Freyre, 2005)
Nos brinquedos cantados encontra-se o canto, a poesia, a dança, a  brincadeira, o compartilhar, devido a simplicidade musical, riqueza simbólica e ludicidade  peculiar; as vivências através destes elementos lúdicos, conquistam a criança como  aquilo que é próprio do seu tempo.
Os termos brincar e jogar são referenciados como sinônimos por Cascudo  (1988). Nos principais idiomas internacionais (Inglês, Francês, Alemão e espanhol),  brincar e jogar também serve para definir atividades artísticas como a interpretação  teatral ou musical (Santa Roza,1993). Na língua portuguesa o termo “brincar” vem do  latim vinculum e significa laço, união. No entanto é o termo lúdico da nossa língua,  também proveniente do latim “ludus”, que melhor abrange e define as atividades  artísticas, culturais, brincadeiras e jogos. (ibid.)
Passando para o lado prático, vamos brincar com quatro exemplos curiosos do  cancioneiro infantil brasileiro. O primeiro se chama “Uma, duas angolinhas”, é um  brinquedo cantado tipo parlenda em roda, com as crianças sentadas, e um solista ao  meio dando beliscos nas mãos de cada colega enquanto cantam as quadrinhas:
Aquele que tirar a mão por último, Vai leva um be-lis-cão.  Além do beliscão refletindo a idéia da galinha d’angola beliscando as mãos de  cada participante, a protagonista da música, uma ave, é um dos mais importantes mitos  iorubanos sobre a origem da criação do mundo; conta Lopes (2004) que “a galinha  d’angola ciscou sobre as águas iniciais uma porção de terra e a espalhou por todas as  direções fazendo nascer terra firme”. Por este mito e outras razões ela também é  considerada a primeira iaô e é o animal mais importante dentro da tradição dos orixás.
No divertido brinquedo cantado “O Saci Pererê”, as crianças em pé na roda,  devem cantar e imitar as habilidades do saci mostradas na música:
O Saci Pererê, pula numa perna só,
Ele toca o tambor, toca como ele só.
O Saci Pererê, pula numa perna só,
Ele toca o pandeiro, toca como ele só. (…)
Esta brincadeira é aberta a improvisações na letra, onde se podem colocar  quantos instrumentos quiser para o Saci tocar e consequentemente para as crianças  imitarem. O Saci Pererê, elemento tradicional no nosso folclore, aproxima-se de várias  figuras da mítica iorubana como: Exu (em suas traquinagens); Arôni (duende iorubano de  uma perna só, ligado a Ossãim, e que vive nas matas); e ainda é referenciado a uma  palavra do campo semântico da magia e do sortilégio em ioruba “Ásasí”, conforme  assinalado em Lopes (2004 e 2006).
Outro brinquedo cantado de significado muito expressivo é o Tangolomango; as  crianças brincam em roda também para contagem de números decrescentes, no qual um  participante deve deixar a roda ao final de cada verso. Eis algumas quadras desta  cantiga:
Eram dez irmãs numa casa, Uma delas foi tocar o fole,
Deu um Tangolomango nela, E das dez ficaram nove.
Eram nove irmãs numa casa, Uma delas foi fazer biscoito,
Deu um Tangolomango nela, E das nove ficaram oito.
Eram oito irmãs numa casa, Uma delas foi amolar canivete,
Deu um Tangolomango nela, E das oito ficaram sete. (…)
A simbologia contida nesta brincadeira onde a cada momento uma criança deixa  de fazer parte do grupo acometida pelo Tangolomango, vai de encontro as diversas  referências a esta palavra como “Uma doença atribuída a feitiçaria, bruxedo, azar,  infelicidade, morte” (LOPES, 2004). Nota-se que este assunto é bastante difícil para o  entendimento das crianças e carregado de discriminação e preconceito racial, social  entre outros.
Como é de praxe, vamos terminar em samba com uma brincadeira muito  conhecida no sudeste brasileiro, onde as crianças finalizam a música sambando
conjuntamente na roda – como fazem os adultos.
Samba Lelê ta doente, Tá com a cabeça quebrada,
Samba Lelê precisava, É de umas boas lambadas,
Samba, samba, samba ô Lelê, Samba, samba, samba ô Lalá. (bis)
Nosso velho conhecido samba não poderia ficar de fora das brincadeiras das  crianças. Samba é um nome genérico para várias danças brasileiras e para a própria  música; contudo, foi registrado em Angola o verbo  samba  querendo dizer “cabriolar,  brincar, divertir-se”; é remetido também a palavra semba de origem Bantu significando o  mesmo que umbigada. A propósito, “Lê” é o nome do menor dos três atabaques da  orquestra ritual dos candomblés jeje-nagô (LOPES, 2004). As crianças se divertem  aprendendo e ensinando a dança do samba umas às outras. Este parece ser o maior  objetivo dos brinquedos cantados: transmitir a cultura pela oralidade e pela corporeidade,  favorecendo a vivência, a elaboração e o desenvolvimento da criança.
Buscamos neste trabalho retomar um pouco o tema da africanidade permeada em  nossa cultura desde a infância. Há centenas de outros exemplos, mas, precisaríamos de  um espaço específico para mostrá-los.
Acredito que dar à criança a oportunidade de brincar, cantar e dançar é investir num  caminho de busca da essência do ato, da mente, da voz e do pertencimento inventando o  prazer de ser feliz! Para ambientar o final deste artigo, deixo alguns versos de uma  música popular brasileira do compositor Gonzaguinha que é um exemplo de ciranda:
REDESCOBRIR
Como se fora brincadeira de roda (memória)
Jogo do trabalho na dança das mãos (macias)
O suor dos corpos na canção da vida (história)
O suor da vida no calor de irmãos (magia) (…).



Referências:
CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. 6ª edição. Belo  Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Editora Universo, 1988.
COSTA, Clarice Moura. O Despertar para o outro: Musicoterapia. São Paulo: Summus  editorial, 1989.
FREGTMAN, Carlos Daniel.  Corpo, Música e Terapia. São Paulo: Editora Cultrix Ltda,  1989.
FREYRE, Gilberto. Casa grande e Senzala. 50ª edição. São Paulo: Global Editora, 2005.
LOPES, Nei.  Enciclopédia Brasileira da Diáspora Africana. São Paulo: Selo Negro  Edições, 2004.
__________. Dicionário Escolar Afro-brasileiro. São Paulo: Selo Negro Edições, 2006.
PAIVA, Ione Maria R. Brinquedos cantados. Rio de Janeiro: Editora Sprint ltda. 1998.
SANTA ROZA, Eliza. Quando brincar é dizer: A experiência psicanalítica na infância.
Rio de Janeiro: Editora Relume Dumará, 1993.


Autora: Denise Guerra


Fonte: Revista África e Africanidades – Ano 2 – n. 5 – Maio. 2009 – ISSN 1983-2354

Um comentário:

  1. Adorei seu blog e gostei bastante das referências que você utiliza. Parabéns pelo trabalho!

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